FORUM DE DEBATE POLÍTICO

domingo, março 05, 2006

As evidências

Se as houvesse, se as evidências fossem aquilo que é suposto serem, para quê tanta discussão, sequer tanto pensamento?
A realidade entrar-nos-ia olhos adentro, sem custo e sem chatice. Não nos indisponhamos connosco e com os outros. Como seria bom contemplar?
Mas as evidências têm o sortilégio de não terem as propriedades que nós lhes atribuímos. Que elas possam existir, não contestamos. Mas que, para lhes aceder, é necessário um longo caminho parece-nos “evidente”.
Que elas são efémeras e nos deixam sempre outro caminho ainda mais longo a percorrer parece-nos “evidentíssimo”. Tal constitui o sacrifício de pensar.
As evidências não são eternas, medem-se, não têm balizas nem prefiguram um fim.
A relativização das evidências é o primeiro pressuposto para quem quer progredir no pensamento. Supor que tudo está sabido, que o caminho está delimitado e que o objectivo é só um é a negação da natureza humana e o aconchego dos indigentes.
Nunca, mas mesmo nunca, nos podemos suportar numa realidade fugidia. Esta constitui o nosso domínio, o campo da nossa acção, nela assenta o caminho em que permanentemente construímos o nosso futuro.
Mas somos nós próprios que o temos que desbravar. Para que a realidade nos não fuja mais do que já nos fugiu até hoje.



Manuel de Sousa Pires Trigo